quinta-feira, 27 de setembro de 2007

´Josefa´

Josefa acordou com as batidas em sua porta. Olhou para seu marido e o viu pensativo, posteriormente a ditar-lhes ordens:
- Zefa, são os policiais. Eles vieram me buscar, certamente não farão nada a você, já que o menino está em casa. Mantenha a calma. Vá e jogue no poço os documentos e artigos embrulhados por aquele saco preto que está no guarda-roupa. Enquanto isso vou enrolar os policiais.
A negra andou descalça, a fim de não fazer barulho com os pés, e seguiu as ordens de Carlos, logo foi até a porta onde estavam seu marido, Barros, o delegado, e mais outros dois policiais.
Ela sabia que cedo ou tarde aquilo ia acontecer. Os policiais invadindo sua casa e levando o homem que amava tanto. Já havia pensado em todas as maneiras para evitar aquela situação e tomado todas as precauções indicadas pelo partido. Fazia meses que não visitava sua família por ventura de ser perseguida e colocando em risco seus parentes. Sua mãe viu seu neto apenas uma vez, e lhe cobrava a presença da filha e do menino. A mulher já não saia pelas ruas paulistanas durante a noite de mãos dadas com o marido. Nesses encontros eles confessavam a esperança na Revolução e no futuro que o pequeno filho terá junto a um Brasil recém formado.
- Vistam-se que vocês serão levados a delegacia. Já sabemos quem na verdade são vós e sua atitudes subversivas - disse um policial
- Não tenho nada a confessar.
- Mentira. Logo o partido será aniquilado já estamos cientes de todos os dirigentes da célula paulistana.
Aquela informação fez o coração de Carlos dar um batimento descompassado, mas o Homem ignorou o órgão e acreditou ser uma blasfêmia as palavras do policial.
- Vistam-se
- Ela não pode, tem que ficar com o menino. Ela não sabia que eu era comunista antes de ter se casado comigo. Não a levem.
- Não será você que me ditará ordens.
A família se vestiu, o menino chorava de fome. E, mesmo assim quase foram despejados no carro senão fosse uma vizinha que deu a criança uma garrafa de leite.
Chegaram a delegacia, e chamaram a atenção dos transeuntes. Carlos olhou bem para eles e disse:
- Estamos sendo presos por lutarem por vocês, o povo...
E o policial lhe deu um soco na nuca para calá-lo, ao passo que Barros afastou os pedestres.
Separaram-na do marido e filho, jogaram-na numa cela úmida e escura. Ali sozinha começou a chorar. Não era certo a deixarem ali, ela nao havia cometido nenhum crime. Ela era uma revolucionária e seus olhos brilhavam quando imaginava um Brasil igualitário. É uma mulher igual a todas, tem seu filho para criar e afagar em momentos de choro, como aqueles que os separaram. E Carlos, seu homem, o herói que se sacrificava por todos e adorava tudo o que fazia. Não o culpava, o queria perto, apenas para no caso de torturá-lo se colocar a frente e peitar aqueles ditadores.
Pensando nisso, não se deu conta que a madrugada de estendia e de repente 4 policiais entram bêbados em sua cela. Falando em voz alta a chamam de vagabunda e outros nomes desprezíveis, já mostram nenhum respeito com ela. São necessários três homens para segurá-la, enquanto o outro a despe. Josefa não acredita no que se sucede ela grita para alguém socorrê-la, como se sua voz alcançasse o ouvido de Carlos. Mas por mais que grite não impede que o cretino abuse de seu corpo.Não impede que o segundo a penetre. Não impede que o terceiro se esfregue em seu corpo. Não impede que o quarto a estupre.
Josefa fica paralisada, sem reação quando os cretinos saem da cela. Deseja a morte deles e sente nojo de seu próprio corpo. Ela perde a noção da hora e de repente lhe dão uma comida salgada. `Aonde estará Carlos? E meu bebê?` ela se pergunta e pensa neles com todo carinho. Faz planos para sua família. E não demora muito um grupo maior de policiais abrem sua cela novamente. Ela corre o quando pode entre o cubículo para fugir dos miseráveis, mas nao consegue, é pega de novo e tornam do amor um ato desprezível.
As visitas dos policiais tornam-se frequentes. E os berros de Josefa também. Nos interrogatórios com um alicate arrancaram suas unhas, mas ela vê que isso é melhor que as visitas dos guardas. Para acalmar seu espírito pensa em Carlos, e que se revelar algo ele nunca a perdoaria, nunca passaria a mão em seus cabelos e a beijaria. Nunca veria seu filho crescer. Sonha com ele na faculdade e depois mostrando-lhe um diploma.
O abuso de seu corpo durou 5 dias. A gota d´água ocorreu quando a levaram para uma sala. Ali encontrou seu marido nu com os órgãos genitais amarrados em fios elétricos e no mesmo estado seu companheiro Zé Pedro.
Quantas vezes os três não se reuniram em sua casa passando noites insones planejando uma greve, ou a vibração dos companheiros de Santos que se negaram tanto tempo a carregar as cargas de café para os navios fascistas? Ou ainda a determinação da célula que nascia em Mato Grosso? Quantas idéias revolucionárias para mudar a nação saíram da cabeça desses homens? Em noites que ela ficava os admirando e sonhando com a realidade, num paralelo que paradoxalmente se encontra.
A amarraram também. Vendo melhor os homens via que haviam sofrido muito e estavam irreconhecíveis com todo corpo inchado de tanto torturado.
Barros começa a fazer chantagens para que eles confessem o paradeiro de Ruivo e João, outros dirigentes fundamentais do partido em São Paulo. Eles negam, essa cnfissao seria o fim para todos os projetos esquerdistas, não podiam permitir o vazamento dessa permissão.
Frurioso, Barros pede que o médico viciado em coca e o policial entrem na sala.
O médico tremia pela falta de sua droga, e o policial trazia em mãos a criança fruto do amor de Carlos e Josefa.
Não, não podia ser verdade que aqueles porcos pretendiam fazer aquilo. Não, muita maldade. É apenas uma criança.
Despiram o menino, colocaram-no de costas em uma mesa ele começou a engatinhar e novas chantagens foram feitas a negra. Carlos a disse:
- Zefa, se você contar nosso menino terá vergonha de você a vida toda. E você viverá com indignidade.
E a mulher soluçava. Barros pediu para ligar o tango argentino para abafar os gritos do cubículo.
Com um chicote o policial batia na criança, mas ninguém foi capaz de ouvir o estalo ou os berros do pequeno que se contorcia de dor. Sua mãe gritava, uma voz que não era dela.
Logo o médico diagnosticou, a negra cheia de sonhos e revolucionária cantava apenas canção de ninar, havia enlouquecido.

6 comentários:

Anônimo disse...

Cada dia eu me orgulho mais de você!
bJS eVElin

Jean disse...

todo arrepiado aqui!
ótima história, com fatos e tdo mais, adorei!
há de sair uma grande escritora ai, algumas cronicas pra um grande jornal, né? hauiha
parabéns!

Vinicius Santucci Rossini disse...

incrivel!!!
parabéns !
nem sei nem o que escrever...
quando escrever um livro manda um pra mim heim
ehaUHEUAhe
vc é 10 ^^

Stylus disse...

Caramba, o Jean me mostrou o blog e achei sensacional! Esse texto é MUITO bom, quase chorei aqui. Vou virar um leitor e fã assíduo! ^^

Stylus disse...

Piracicaba? Não, sou de Belém mesmo, láááá do Pará.

[PAUSA] Calypsooooo!!!! [/DESPAUSA]

Ai credo... i.i

Linkar? Mas é claro! =D

Vou linkar você também! _o/

Lília Viana disse...

Luu!! Estou extremamente feliz com o que li. Você escreveu muito, mas muito bem!
Incrivel como você conseguiu criar a história dando um ar de verdade tão grande. As palavras usadas também... Faz a gente se envolver completamente.
Adorei mesmo!!

História triste... em pensar que isso e coisas semelhantes aconteceram inúmeras vezes.
Mas o bom é saber que em muitas vezes o ideal sobreviveu a tudo! Essa é a parte bonita.



Lu, quanto ao clipe da Plebe Rude.. entra aqui www.dinamicoerre.com.br lá tem o link. Só to insistindo pq eu acho que vc vai gostar mesmo da música :)
"R ao contrário" é o nome da música. Isso nos leva a pensar em "acerte". Acho que vc vai gostar da letra.


Beijoss :)